21 de julho de 2014

Histórias (i)reais... Shaka!


A manhã promete...Acordo com o feeling de ser um dia brutal. As ondas despertam que nem bombas de alto astral e o vento com energia onshore.
Apressado, voo pelas escadas directo à minha quiver escolher a prancha do dia. Escolho duas. Arrumo o wax, uma sweat na mochila, enfio um gorro e os ténis e esqueço tudo ao meu redor, pois não há nada melhor que um dia de surf não cure.
Completamente extasiado, atiro-me na areia deserta. Sinto as minhas costas colarem-se na areia molhada. Olho o céu límpido de um azul transparente, repleto de pontos brilhantes e irrequietos que brincam com a minha íris. Ouço o meu coração acelerado, os meus pés estão engelhados e mesmo com um 4.3 sinto o corpo gelado. Mas o que interessa isso. Meros pormenores.
Dispo a minha segunda pele de tubarão até à cintura, enfio o bico na areia e encosto-me à rocha dos perceves da baixa-mar, e converso com a minha sereia encantada, envolto pelo perfume de iodo que emana do fumo das ondas que morrem em espuma na areia.
Ela canta-me ao ouvido, sabiam? Dizem que o canto da sereia encanta e engana. Será mesmo assim?
A vida tem estranhas formas, tal como o verso fadado, “estranha forma de vida”. E tal como a sereia, encanta e engana.
É no mar que entranho as coisas estranhas que ela me mostra. Por vezes acho que preciso de algo que a vida não me dá e, em contra partida, não preciso do que penso precisar. Será que a vida brinca comigo?
Brinca, brinca muito a sério, e as suas personagens brincam, nós brincamos uns com os outros, com quem mais gostamos e admiramos e com quem nada acrescenta.
A minha sereia conta-me histórias, muitas histórias de piratas, de conquistadores, de príncipes e aventureiros...histórias que continuam vivas tal como o peso de âncoras seculares afundadas com essas mesmas histórias. E no canto doce e encantador ouço os sentimentos de quem também ouviu o prazer e a decepção, os risos da felicidade e o choro queixoso, a raridade de sentimentos bons e o incondicional inesquecível, a palavra amo-te e odeio-te, a cobrança e o julgamento versus incentivo e coragem, as paixões avassaladoras, as cicatrizes a sarar, a música que narra esperanças e emoções, o que damos à vida e o que a vida nos dá...
E afinal, o que é esta melodia quase angelical que ecoa por entre os mares e nos seduz? Esta estranha forma de vida é simplesmente o eco do canto racional da sereia, sofredor e mortal.
Surge na linha do horizonte, o set que por tanto esperava. Sou um big rider, sou um lutador.
Enfio-me no meu fato negro, pego-me à prancha e mergulho no sentido da minha vida, que só eu estranho e entranho. I am a free surfer. SHAKA. Shaka!  

(tradução de shaka – "está tudo bem")


Dulce Madalena Guarda 

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